domingo, 2 de agosto de 2009

Ufologia Analfabeta?

Publicado originalmente no site CeticismoAberto de Kentaro Mori

“Eis, portanto, a conclusão: um amontoado de interrogações. Que só fariam perderem-se inúmeras folhas de papel. Desgaste e gasto desnecessários. Nada se pode concluir, como nunca se pôde, de qualquer caso ufológico. Nem que seja realmente ufológico”. – Ubirajara Franco Rodrigues

São declarações bombásticas, talvez estarrecedoras aos entusiastas da ufologia, vindas como vieram de um dos mais destacados ufólogos no país e que se tornou figura maior como descobridor do conhecido “caso Varginha” já há mais de dez anos.

E são declarações contidas ao final de seu livro a respeito do caso, publicado no ano de 2001 pela “Biblioteca UFO”, editado por Ademar Gevaerd, editor da revista de mesmo nome. Há quase dez anos. No sítio online da publicação, ele ainda é promovido como “o livro ufológico mais importante dos últimos tempos”.

O leitor e leitora casuais talvez não entendam bem por que estou ressaltando estas informações, mas caso sejam entusiastas da ufologia, espero que já tenham compreendido por que são relevantes.

Nas edições de maio e junho deste ano de 2009 a mesma revista UFO publicou uma entrevista em duas partes com o mesmo Ubirajara Rodrigues, apresentada como “uma grande surpresa para a ufologia brasileira” já no editorial, escrito pelo mesmo Gevaerd. “Virando a mesa da Ufologia Brasileira” é intitulada a entrevista, que é introduzida por nada menos que três páginas em que Gevaerd busca enquadrar em seus termos o que o próprio Rodrigues expressará em sua entrevista.

Em resposta à “surpreendente entrevista”, que “causou perplexidade nos leitores e em toda a Comunidade Ufológica Brasileira”, houve reações “em geral, bastante críticas à nova postura do entrevistado” (grifos introduzidos). Como o editorial da segunda parte anuncia, “serão publicadas em nossas próximas edições”.

Pois bem. Apontando o óbvio, tanto interessados casuais na ufologia quanto entusiastas devem estar se questionando como as posições de Rodrigues poderiam ser uma “grande surpresa” se estavam expressas claramente há quase dez anos, em livro “mais importante dos últimos tempos”, publicado pela mesma empresa que edita a revista, editado exatamente pelo mesmo editor que é o entrevistador.

Não posso responder a tal sem incorrer em caminhos muito delicados, mas posso indicar pelo menos duas explicações possíveis de pronto. A primeira é a de que “toda a Comunidade Ufológica Brasileira” é simplesmente analfabeta, incapaz de ler um texto, que se dirá um livro, e assimilar seu conteúdo exceto com muita dificuldade.

Uma segunda explicação alternativa é a de que a grande “surpresa”, a total “perplexidade”, sejam um embuste, uma falsa reação a uma postura que Rodrigues manifesta nada secretamente já há quase dez anos mas que só neste momento calhou de ser apresentada como uma “virada de mesa”. É, todavia, apenas uma explicação possível.

Caberiam muitos comentários sobre o mais novo imbróglio a agitar a “comunidade ufológica brasileira”, contudo desde que o auto-intitulado representante da mesma fugiu do compromisso público assumido de provar o que vende, buscamos não dar muita atenção a tais estripulias, exceto em casos de extrema irresponsabilidade.

Vale mencionar no entanto, que este que escreve aqui troca cordialmente idéias e informações com vários ufólogos, incluindo Ubirajara Rodrigues, há um bom tempo. Não se pode contestar o que não se conhece. Posso dizer que inúmeros ufólogos, dos mais renomados pelos entusiastas, não só tinham plena consciência das posturas de Rodrigues que sim mudaram, anos atrás, como não poucos partilham dessas novas idéias.

E como demonstração de tal, Rodrigues, em co-autoria com Carlos Reis e a participação de inúmeros outros ufólogos, lança no final deste mês o livro “A Desconstrução de um Mito” (2009, LivroPronto), uma crítica contundente aos rumos atuais da ufologia nacional e uma tentativa de renovar o cenário, introduzindo finalmente ao país idéias e abordagens mais sofisticadas exploradas no exterior há décadas.

Caso o leitor tenha se perguntado parágrafos acima por que poderia ter vindo a calhar justo neste momento apresentar as conhecidas posições de Rodrigues como grandes surpresas, bem, talvez eu não precise fazer nenhuma sugestão a respeito.

Considerando a possibilidade de que “toda a Comunidade Ufológica Brasileira” seja analfabeta, a obra pode não impactá-la, mas nós em CeticismoAberto sempre apostamos na sua inteligência. Nosso sítio, cético e repleto de letras, é o mais visitado sobre ufologia e paranormal em bom português, com o dobro e mesmo o triplo de visitação do sítio online da revista de circulação nacional que mencionamos nesta nota.

Talvez seja puro otimismo, mas apostamos que no fim deste mês, ainda que simbolicamente, uma nova ufologia, encabeçada por ufólogos veteranos mas de idéias renovadas – já há vários anos – surja para que o debate se enriqueça e não tenhamos que falar de falsos profetas e charlatães sempre que discutimos o assunto no Brasil.

Se há uma ufologia analfabeta, há outra que não o é.

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